Friday 22 June 2007

UM PAÍS NO FIM DO MUNDO

Um dia peguei numa revista.
Folheei ao acaso, só mesmo para me sentir integrado. Se alguém nos vê folhear uma revista pode ficar com a impressão de que compreendemos o que estamos a ler. Não era o meu caso, infelizmente. O meu russo só chega mesmo para coisas simples como “Obrigado”, “Bom dia” ou “Sr Agente, juro que não bebi nada”. Todavia, folheava.
De repente, para meu grande espanto, vejo imagens de Portugal, e um corpo de texto a acompanha-las, exaltando as virtudes da minha pátria , assim esperava.
Quando pedi que me traduzissem o título do artigo, nem queria acreditar. As fontes latejavam-me, na minha ira de justo.
O título rezava assim “Portugal: esse país no fim do mundo”. Excuse me?!!!!
Mas afinal quem é que esta no fim do mundo? E eu estes anos todos a pensar que a Rússia ou o Casaquistão é que lá estavam, quando afinal...
A vinda para o Casaquistão baralhou irremediavelmente as minhas noções de perto e de longe. Quando um país é quatro vezes maior que França e está entalado entre a Sibéria e a China, “longe” torna-se palavra obrigatória em qualquer diálogo sobre o país.
A anexação voluntária ao império russo em finais do século XIX criou um novo centro do mundo neste mundo: Moscovo. A estepe casaque já não era um espaço infindável perdido entre nada e coisa nenhuma – fazia parte da União Soviética. De Moscovo, farol de igualdade e civilização, irradiava poder, conhecimento, desenvolvimento e doutrina (importados a um preço muito elevado, pago em sangue).
Se durante o império vermelho todas as repúblicas soviéticas gravitavam em torno desse novo centro, com a tão desejada independência o Casaquistão não regressou propriamente ao longe e ao esquecimento.

O farol de Moscovo já não mais brilhava. No entanto, por fortuna ou não, o mundo lá foi deixando ideologias de parte, e eis que novos centros emergem, no sentido literal. Por aqui, emerge mesmo, e é do chão, ou melhor, sob ele.

Ao descobrir reservas de petróleo monstruosas, o Casaquistão já nao fica longe, muito pelo contrário. Encontra-se agora entre grandes players mundiais, a Rússia e a China, abastecendo-os de petróleo e minerais, gerindo esta vizinhanca com uma habilidade pouco habitual nestas repúblicas muitas vezes geridas por pessoas que nem deveriam poder sequer gerir uma tabacaria.

Assim, o tal artigo não estava tão longe da verdade. “O fim do mundo está próximo”, diz a Bíblia. Está próximo quando se está longe de centros de actividade económica ou cultural, e essa actividade já nao escolhe obrigatoriamente Nova Iorque, Londres ou Berlim.
O fim do mundo tanto pode estar em Santo António dos Cavaleiros como em Chisinau, capital da Moldávia e o centro do mundo pode, por sua vez, estar em Bombaim ou em Astana, capital do Casaquistão.
Mesmo sem petróleo, acredito que Portugal tem potencial para ser tornar um centro, bastando que o definamos e defendamos bem.
Para que nunca mais ninguém ouse dizer que estamos no fim do mundo, mas antes no princípio.

1 comment:

kitty said...

Huummm, é tudo uma questão de perspectiva e de ângulo de observação…tu aí, nós aqui, 2 continentes distintos…Mais uma vez fizeste-nos soltar uma gargalhada! Tive uma identificação pessoal grande com este artigo, pois uma vez também fui surpreendida!… com a Wallpaper que tinha uma foto na capa de Astana e um artigo extenso sobre essa “capital no fim do mundo”? Continua a brindarnos com este humor inteligente!