Friday 15 June 2007

Mersedes

Alo! Aqui a vai a cronica semanal.

É sempre possíivel estudar sociologia numa universidade, mas eu prefiro faze-lo num taxi, por exemplo.
Os terços que pendem piamente do retrovisor ou os baixos-relevos de São Cristovão que adornam o tablier podem ensinar tudo o que há a saber sobre a relação entre o homem e os símbolos de protecção. Amuletos, figas, cruzes, vão variando de região em região. Cá, pelos meus (novos) lados, a prática do Islão criou um amuleto próprio, o Tumar (os Cavaleiros Tempários revolver-se-iam nas tumbas se soubessem disto). O Tumar é um triângulo de cabedal que contém um fragmento do Al Corão, e é oferecido para conferir protecção. Pode ser usado ao pescoco, ou então, como mandam as ancestrais tradições nómadas – pendurado no retrovisor do carro.
Mas há uma nova ordem de amuletos hoje em dia – as marcas. Já não protegem contra demónios e feitiços, mas contra o mau-olhado da indiferenciação social. Se no mundo ocidental já somos filhos das marcas de segunda geração, por aqui ainda mal entrámos na primeira. As marcas, quaisquer marcas, são grosseiramente omnipresentes.
Há quem veja no reverso da brilhante medalha do capitalismo global o negrume do trabalho semi-escravo do qual resultam muitos dos nossos produtos de consumo. Isso, na minha óptica, empalidece em face de outro problema bem mais vasto e de mais difícil resolução: o mau gosto que o crescimento económico permite.
Quem dantes tinha uma camisa para toda a vida, hoje pode comprar as mais horrorosas T-shirts falsificadas, com motivos e cores que estragaram as paisagens idílicas da Ásia Central para todo o sempre.

O pior é quando vemos objectos de vários tipos ostentando marcas conhecidas que claramente não poderiam ter sido criados pelas marcas que apresentam. Isto chamar-se-ia falsificação de segundo nível, em que o falsificador, inspirado pela marca em causa, se deixa levar na vertigem da criação. Pobres tolos!... (os que compram estas coisas, é claro).

Há, contudo, no Casaquistão (mas não só), um nível de falsificação mais interessante ainda, que eu chamaria de falsificação corporativa. Porquê recorrer a um franchising, que implica investimento inicial considerável, apertado controle financeiro e logístico por parte do master , quando mais facilmente podemos adaptar nomes internacionais, dar-lhes uma pequena volta e abracadabra! Eis um negócio!
Podemos igualmente usar o nome de uma pessoa conhecida, dar-lhe uma voltinha ao nome, e eis-nos com o automático endorsement da dita pessoa (que obviamente nem sonha com o facto).
Ou então, podemos fabricar um automóvel (se formos chineses) e dar-lhe o nome de uma marca internacional (só que mal escrito), para supostamente darmos mais confianca ao comprador.

Portanto não me venham falar de fazer compras em Nova Iorque, Milão ou Paris. That’s so last year...

Em que mais local do mundo pode um homem comer um hamburger no King Burger, comprar uma peça de roupa para a namorada na loja Victoria Beeckham e depois ir para casa num autocarro Mersedes?

3 comments:

kitty said...

Fenómeno interessante esse! A Janis Joplin por essas bandas cantaria outra música, tipo... "Oh Ala, wont you buy me a Mersedes Zben?"

Anonymous said...

O meu amigo está-se a esquecer que por cá, pelo menos para alguns sortudos que descobriram como os comprar, tambem existem os "Marcedes". Raça superior essa! Aliás estou a tentar desenvolver a teoria de, se esses gajinhos, não serão os mesmos dos " Rabuçados" e das Farramentes - Hummm, são, não são?

Unknown said...

Ó Zeca manda os gajos "tumar" no "occulum descansum est"... exactamente ... e já agora com a "farramenta" que Serra Afonso menciona!! Eu, Mercedes, conhecia uma, espanhola, mas largava fumo ... ainda não estava catalizada (ou seria "catequisada?). Que saudades da Mercedes Diesel!!!